16 de mai. de 2010

Reflexão Excelente vale a pena LER

Do mundo virtual ao espiritual


Ao viajar pelo Oriente, mantive contatos com monges do Tibete, da Mongólia, do Japão e da China. Eram homens serenos, comedidos, recolhidos em paz em seus mantos cor de açafrão.

Outro dia, eu observava o movimento do aeroporto de São Paulo: a sala de espera cheia de executivos com telefones celulares, preocupados, ansiosos, geralmente comendo mais do que deviam. Com certeza, já haviam tomado café da manhã em casa, mas como a companhia aérea oferecia um outro café, todos comiam vorazmente. Aquilo me fez refletir: “Qual dos dois modelos produz felicidade?”

Encontrei Daniela, 10 anos, no elevador, às nove da manhã, e perguntei: “Não foi à aula?” Ela respondeu: “Não, tenho aula à tarde”. Comemorei: “Que bom, então de manhã você pode brincar, dormir até mais tarde”. “Não”, retrucou ela, “tenho tanta coisa de manhã...” “Que tanta coisa?”, perguntei. “Aulas de inglês, de balé, de pintura, piscina”, e começou a elencar seu programa de garota robotizada. Fiquei pensando: “Que pena, a Daniela não disse: “Tenho aula de meditação!”

Estamos construindo super-homens e supermulheres, totalmente equipados, mas emocionalmente infantilizados. Por isso as empresas consideram agora que, mais importante que o QI, é a IE, a Inteligência Emocional. Não adianta ser um superexecutivo se não se consegue se relacionar com as pessoas. Ora, como seria importante os currículos escolares incluírem aulas de meditação!

Uma progressista cidade do interior de São Paulo tinha, em 1960, seis livrarias e uma academia de ginástica; hoje, tem sessenta academias de ginástica e três livrarias! Não tenho nada contra malhar o corpo, mas me preocupo com a desproporção em relação à malhação do espírito. Acho ótimo, vamos todos morrer esbeltos: “Como estava o defunto?”. “Olha, uma maravilha, não tinha uma celulite!” Mas como fica a questão da subjetividade? Da espiritualidade? Da ociosidade amorosa?

Outrora, falava-se em realidade: análise da realidade, inserir-se na realidade, conhecer a realidade. Hoje, a palavra é virtualidade. Tudo é virtual. Pode-se fazer sexo virtual pela internet: não se pega aids, não há envolvimento emocional, controla-se no mouse. Trancado em seu quarto, em Brasília, um homem pode ter uma amiga íntima em Tóquio, sem nenhuma preocupação de conhecer o seu vizi¬nho de prédio ou de quadra!

Tudo é virtual, entramos na virtualidade de todos os valores, não há compromisso com o real! É muito grave esse processo de abstração da linguagem, de sentimentos: somos místicos virtuais, religiosos virtuais, cidadãos virtuais. Enquanto isso, a realidade vai por outro lado, pois somos também eticamente virtuais…

A cultura começa onde a natureza termina. Cultura é o refinamento do espírito. Televisão, no Brasil - com raras e honrosas exceções -, é um problema: a cada semana que passa, temos a sensação de que ficamos um pouco menos cultos. A palavra hoje é ‘entretenimento’; domingo, então, é o dia nacional da imbecilização coletiva. Imbecil o apresentador, imbecil quem vai lá e se apresenta no palco, imbecil quem perde a tarde diante da tela.

Como a publicidade não consegue vender felicidade, passa a ilusão de que felicidade é o resultado da soma de prazeres: “Se tomar este refrigerante, vestir este tênis,¬ usar esta camisa, comprar este carro, você chega lá!” O problema é que, em geral, não se chega! Quem cede desenvolve de tal maneira o desejo, que acaba¬ precisando de um analista. Ou de remédios. Quem resiste, aumenta a neurose.

Os psicanalistas tentam descobrir o que fazer com o desejo dos seus pacientes. Colocá-los onde? Eu, que não sou da área, posso me dar o direito de apresentar uma su¬gestão. Acho que só há uma saída: virar o desejo para dentro. Porque, para fora, ele não tem aonde ir! O grande desafio é virar o desejo para dentro, gostar de si mesmo, começar a ver o quanto é bom ser livre de todo esse condicionamento globalizante, neoliberal, consumista. Assim, pode-se viver melhor. Aliás, para uma boa saúde mental três requisitos são indispensáveis: amizades, auto-estima, ausência de estresse.

Há uma lógica religiosa no consumismo pós-moderno. Se alguém vai à Europa e visita uma pequena cidade onde há uma catedral, deve procurar saber a história daquela cidade - a catedral é o sinal de que ela tem história. Na Idade Média, as cidades adquiriam status construindo uma catedral; hoje, no Brasil, constrói-se um shopping center. É curioso: a maioria dos shopping centers tem linhas arquitetônicas de catedrais estilizadas; neles não se pode ir de qualquer maneira, é preciso vestir roupa de missa de domingos. E ali dentro sente-se uma sensação paradisíaca: não há mendigos, crianças de rua, sujeira pelas calçadas...

Entra-se naqueles claustros ao som do gregoriano pós-moderno, aquela musiquinha de esperar dentista. Observam-se os vários nichos, todas aquelas capelas com os veneráveis objetos de consumo, acolitados por belas sacerdotisas. Quem pode comprar à vista, sente-se no reino dos céus. Se deve passar cheque pré-datado, pagar a crédito, entrar no cheque especial, sente-se no purgatório. Mas se não pode comprar, certamente vai se sentir no inferno... Felizmente, terminam todos na eucaristia pós-moderna, irmanados na mesma mesa, com o mesmo suco e o mesmo hambúrguer do McDonald’s…

Costumo advertir os balconistas que me cercam à porta das lojas: “Estou apenas fazendo um passeio socrático.” Diante de seus olhares espantados, explico: “Sócrates, filósofo grego, também gostava de descansar a cabeça percorrendo o centro comercial de Atenas. Quando vendedores como vocês o assediavam, ele respondia: “Estou apenas observando quanta coisa existe de que não preciso para ser feliz.”



Frei Betto é escritor, autor, em parceria com Luis Fernando Veríssimo e outros, de O desafio ético (Garamond), entre outros livros.









“A pessoa que não lê, mal fala, mal ouve, mal vê" [Malba Tahan].



Vc curte ler? Listou as obras que leu neste ano? Caso positivo, mande sua lista para o e-mail livrosepessoas@gmail.com e participe do mob de leitura.



ORKUT DA LEITURA

O orkut da leitura


SITE DE RELACIONAMENTO SKOOB PROMOVE TROCA DE IDEIAS SOBRE LIVROS E PUBLICAÇÕES, COMO MINI-RESENHAS

Quem dedica boa parte de seu tempo livre às ferramentas de rede social, como Orkut e MySpace, tem agora um novo passatempo. Mas em vez de apenas fazer contato, a brincadeira vale como experiência para a troca de informações sobre livros e até publicação de mini-resenhas. O Skoob (www.skoob.com.br) foi criado no final do ano passado e já tem mais de dez mil cadastrados, a maioria ativa na divulgação das últimas leituras.

Curiosamente, o serviço nasceu no Brasil, em 30 de dezembro de 2008, quase como uma brincadeira. O analista em internet Lindenberg Moreira criou a página para reunir amigos, mas a divulgação em blogs fez o criador liberar o acesso a todos os internautas.

O sucesso do Skoob tem explicação. Além de ser uma ferramenta inédita em português, chamativa para leitores inveterados, o funcionamento do sistema é fácil: o cadastro pede apenas nome, apelido, sexo, Estado, e-mail e senha, além de uma foto opcional. O campo de buscas por usuários e livros também é simplificado.

Os usuários dão cotação para seus livros cadastrados, as tradicionais estrelas, e podem inserir tags como “chorei”, “amei”, odiei” etc. Também é possível mostrar para todo mundo qual livro você está lendo no momento e receber indicações de quem já passou os olhos por aquelas páginas antes.

A febre do Skoob (para quem não percebeu a brincadeira, “livros” em inglês, ao contrário) comprova o anseio do brasileiro em participar de redes sociais pela internet – no Orkut, mais de 50% dos usuários são do País.

Macgrey Kneipel, de Joinville, é um dos que aderiu ao serviço. “Soube do Skoob por meio de uma amiga de trabalho. O que despertou meu interesse foi a oportunidade de trocar experiências.” No site, ele já encontrou pessoas com gosto afim e agora dá uma olhada no Skoob quando procura referências de obras. “Ainda não tive a oportunidade de ler os livros indicados, mas os próximos serão os da série ‘Operação Cavalo de Troia’.”

MULTIMÍDIA- O Skoob foi criado no final de 2008 e já tem mais dez mil usuários cadastrados, que têm a oportunidade de trocar experiências